[OPINIÃO] O lucro da Petrobras é bom? Depende.
- Da Redação com Assessoria
- 30 de ago. de 2018
- 3 min de leitura
O
lucro
anunciado pela
Petrobras
no segundo trimestre do ano nos leva a uma reflexã
o
mais sociológica que econômica. Do ponto de vista empresarial, das decisões de gestã
o
, podemos dizer que a empresa está adotando uma estratégia focada no rápido restabelecimento de suas margens de
lucro
. Isso era de se esperar. Depois de toda a crise institucional, política, econômica e até policial que sofreu,
o
resultado positivo dá evidências de que estã
o
arrumando a casa e buscam um caminho viável para sair do atoleiro. Mas quando se olha para situaçã
o
do país, a pergunta é: a que custo?
A guinada começou em julho de 2017, com a mudança das políticas de preç
o
praticadas pela petroleira. A ANP – Agência Nacional do Petróleo – autorizou que os valores dos combustíveis fossem reajustados diariamente, se necessário, considerando duas variáveis:
o
preç
o
internacional do barril de petróleo e as variações cambiais. Com isso, a empresa atrelou sua receita ao dólar, criando uma situaçã
o
favorável para sua arrecadaçã
o
em períodos de forte valorizaçã
o
da moeda estrangeira, como observado neste segundo trimestre. A partir dessa política de reajuste de preços, a
Petrobrás
ganhou mais fôlego para negociar suas dívidas bilionárias no mercado financeiro.
O
hedge (proteçã
o
) natural da receita em dólares foi fator relevante para a empresa reduzir seu nível de endividamento e apresentar indicadores econômico-financeiros mais saudáveis.
De julho de 2017 a junho de 2018, período no qual a
Petrobras
adotou sua política de preç
o
de combustíveis,
o
barril do petróleo no mercado internacional subiu cerca de 50% e
o
dólar valorizou-se em aproximadamente 15%. As combinações desses dois movimentos fizeram com que a empresa repassasse esses reajustes aos consumidor final, em virtude de seu poder de mercado.
O
posicionamento dominante da
Petrobras
no refino de combustíveis possibilita que movimentos internacionais no preç
o
do barril de petróleo seja repassado, praticamente de forma integral, às distribuidoras. Preços mais elevados da gasolina e do diesel ao consumidor final geraram impactos negativos na sociedade. Os gastos familiares nesses itens aumentaram expressivamente e as empresas e trabalhadores do ramo do transporte e dependentes do diesel tiveram suas margens reduzidas em uma economia extremamente fraca.
Foi nesse ambiente que, concomitantemente, a
Petrobras
iniciou um forte processo de recuperaçã
o
de suas margens de
lucro
e a greve dos caminhoneiros teve início. Impossibilitados de repassarem os aumentos diários do diesel para os fretes de transporte, os caminhoneiros decidiram “cruzar os braços”. Com a paralisaçã
o
do transporte rodoviário de cargas por duas semanas, nossa economia viveu um verdadeiro choque. Falta de combustíveis aos consumidores, escassez de matérias-primas para as indústrias, voos cancelados e alimentos perecíveis perdendo suas validades ilustram alguns exemplos das consequências que essa crise do setor de transporte gerou em nossa sociedade.
De onde vieram entã
o
os R$ 10 bi de
lucro
líquido da
Petrobras
, apenas no segundo trimestre de 2018? A origem desse excelente resultado deve-se ao fato de uma gestã
o
mais eficiente, queda do endividamento, desinvestimentos em áreas menos lucrativas e, sobretudo, na nova política de preços. Entretanto, nã
o
podemos deixar de associá-la com
o
estopim da greve dos caminhoneiros e todos seus impactos na vida dos brasileiros.
A
Petrobras
prejudicou diretamente um de seus maiores clientes:
o
transporte de cargas rodoviárias. Era de se imaginar que a recuperaçã
o
da empresa a qualquer custo traria consequências, ainda mais em um período de recuperaçã
o
lenta da atividade econômica.
O
preç
o
do diesel ficou insustentável e
o
setor parou
o
Brasil por duas semanas. Se olharmos por esse ângulo, percebemos que
o
caminho adotado deixou sequelas em nossa sociedade, as quais vã
o
demorar para cicatrizar.
*Lucas Lautert Dezordi é
doutor em Economia, sócio da Valuup Consultoria e professor titular da Universidade Positivo (UP).
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